Exemplo de documento relativo de uma importante casa comercial de Évora, a "António Anselmo Dias", já desaparecida, que consta do Arquivo da Santa Casa da Misericórdia de Évora. Cota: PT/ADEVR/MIS/SCMEVR//C/010/001 Cx. 15, doc. 31
Os arquivos comunitários e o resgate do esquecimento

Com esta nossa iniciativa, é aos investigadores que cabe agora a responsabilidade de resgatar do esquecimento todos aqueles que têm passado à margem da História, como se nunca tivessem existido.

A Rede de Arquivos do Alentejo – Distrito de Évora (RAA-DE) foi criada em 2016 mas as entidades que a compõem há muito que vêm protegendo o património arquivístico. Os múltiplos cuidados aplicados aos arquivos que vêm sendo colocados à sua guarda demonstram uma preocupação com a preservação da memória organizacional, local e regional, consoante a natureza e a área geográfica de intervenção de cada entidade.

No geral, os principais agentes fautores desta política têm sido o Estado, cujo braço na região se concretiza no Arquivo Distrital, e os municípios, com os seus arquivos municipais. Todos têm competências legais ao nível da proteção e da fruição do património arquivístico, tendo o Estado criado o Arquivo Distrital, em 1916, enquanto alguns dos municípios, nas décadas mais recentes, se esforçaram para criar arquivos.

Embora seja positivo o caminho já realizado, nas sociedades atuais exige-se que os arquivos acomodem, cada vez mais, a diversidade social. A História do futuro não se pode limitar a refletir as vivências e realidades facultadas pelas instituições públicas. Os arquivos devem, cada vez mais, ter um foro comunitário, perpassando uma visão holística e integradora das nuances que compõem a nossa vida em sociedade.

Assim, a RAA-DE decidiu iniciar uma “Estratégia de Salvaguarda do Património Arquivístico” direcionada sobretudo para os municípios, por serem estes quem está mais conectado com a realidade local. A RAA-DE elaborou um documento orientador no qual constam as medidas de salvaguarda e as fases de execução da "Estratégia" para que cada entidade a possa executar.

O objetivo é favorecer a proteção, inclusivamente, através da classificação de interesse cultural, de espólios arquivísticos de entes como associações culturais, recreativas e desportivas, fundações, empresas, famílias e indivíduos.

Conservar, tratar e disponibilizar estes espólios é determinante para a construção de uma comunidade inclusiva e heterogénea em que todos os que hoje a constituem ocuparão também o seu lugar na História.

A RAA-DE começou já a colher frutos desta abordagem, inspirada também no exemplo do Município de Reguengos de Monsaraz, que a vem praticando há cerca de 20 anos, uma vez que vários municípios deram início a projetos de recolha e tratamento de fundos arquivísticos de misericórdias e associações. Esperamos que, dentro de alguns anos, seja possível ter acesso, inclusivamente por intermédio do Portal Português de Arquivos, à documentação disponibilizada neste âmbito. Com esta nossa iniciativa, é aos investigadores que cabe agora a responsabilidade de resgatar do esquecimento todos aqueles que têm passado à margem da História, como se nunca tivessem existido.

Jorge Janeiro

Publicado em 09.06.2020