Renata Vieira é investigadora do CIDEHUS e desenvolve o seu trabalho na área das Humanidades Digitais e Linguística Computacional.
Em poucas palavras, quem é Renata Vieira e qual o seu percurso?
Nasci, cresci e estudei no sul do Brasil, e como estudante tive a oportunidade de conhecer outros recantos desse país, saborear sua a pluralidade cultural e também de conhecer lugares mais distantes em outros continentes.
Estudei as disciplinas de informática e linguística na graduação, e no mestrado fiz uma dissertação na área de semântica formal. Realizei um primeiro estágio internacional, logo após o mestrado, em Portugal. Desenvolvi na Universidade de Edimburgo estudos mais avançados, no Centro de Ciência Cognitiva, que me conferiu o título de PhD em 1998, na área de Linguística Computacional.
Meu interesse acadêmico recai sobre a magia da transmissão de ideias e significados proporcionada pela linguagem, em suas variadas formas: linguagem natural, formal, artificial, computacional. Entre 1998 e 2018 atuei como professora e pesquisadora, e contribuí para a criação de uma identidade nacional (Brasil) para a área de Processamento de Linguagem Natural, formando muitos mestres e doutores.
Cheguei em Dezembro de 2019 ao CIDEHUS com a missão de aproximar o meu trabalho à área das Humanidades Digitais. Quero repensar como a organização computacional do conhecimento pode contribuir à investigação nas áreas Humanas e também refletir sobre as mudanças rápidas que o desenvolvimento computacional traz à comunicação humana. Dessa forma, o Centro Interdisciplinar de História, Cultura e Sociedade é um contexto fértil para aliar pesquisas da Engenharia da Informação com a área de Humanidades.
Qual o trabalho que realizou que considera mais impactante e porquê?
Atuo na área de extração de conhecimento a partir de textos, considerando a língua portuguesa. Esse tipo de pesquisa é importante para problemas como criação automática de dicionários especializados, e engenharia de ontologia, ou seja, recursos relevantes para comunicação especializada e intercultural e em vários idiomas.
Também trabalhei na área de uso e construção de ontologias em diferentes domínios de aplicação; trabalhei, por exemplo, nos domínios de biologia e geologia. Uma recente contribuição importante foi a proposta de uma ontologia para a especificação de sistemas multi-agentes. Esses são sistemas inteligentes distribuídos que, conforme metáfora humana, desempenham funções de maneira social. Aqui as ontologias ajudam a especificar esses sistemas complexos em uma linguagem mais conceitual.
O primeiro trabalho está, portanto, relacionado ao problema de encontrar estruturas no texto, enquanto o segundo mostra como a representação do conhecimento pode melhorar a comunicação que envolve linguagens de computador.
A partir dessa variedade de linguagens com os quais convivemos hoje, estou inclinada a estudar como combinar diferentes fontes de conhecimento ou idiomas diferentes, sobre um mesmo tema, para ampliar e melhor especificar os sentidos pretendidos e melhorar a comunicação entre pessoas e sistemas. Assim, desenvolver uma compreensão de como múltiplas e variadas fontes de conhecimento podem interagir entre si para enriquecer e expressar ou especificar melhor um problema ou domínio. Um ponto central é o alinhamento ontológico, porém amplificado para o problema do alinhamento semântico entre diferentes estruturas de conhecimento (incluindo, mas não limitado a, ontologias).
A ser apresentado no PROPOR 2020, Conferência Internacional sobre o Processamento Computacional do Português que acontece em março em Évora, temos um artigo que descreve os avanços iniciais desse novo projeto: Aligning IATE criminal terminology to SUMO. Onde SUMO é uma ontologia de fundamentação.
Que papel podem desempenhar as Humanidades Digitais, dentro e fora da academia?
As Humanidades Digitais são um exercício de interdisciplinaridade, desenvolvem-se com a combinação de vários saberes, é um exercício acadêmico importante. O desenvolvimento tecnológico e as Humanidades necessitam realizar trocas entre si para avançar. Saber escutar os outros, se colocar no lugar do outro, não excluir as diferenças para construirmos juntos é essencial dentro e fora da academia. A formação de base deve procurar integrar valores e saberes “humanos” com valores e saberes “digitais”, numa via de duas direções. A partir do momento que tecnologias digitais fazem parte do nosso cotidiano, nossa comunicação, nossa linguagem, nosso mental e também do nosso corpo, devemos nos preocupar a ver o mundo a partir de uma integração das duas óticas.
Os resultados do trabalho realizado por Renata Vieira, mencionados acima, podem ser encontrados nos seguintes artigos:
Estimating term domain relevance through term frequency, disjoint corpora frequency - tf-dcf. Knowledge-Based Systems, v.97, p. 237-249, 2016.
Model-driven engineering of multi-agent systems based on ontologies. APPLIED ONTOLOGY, v. 12, p. 157-188, 2017.